segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Milionário excêntrico decide pintar toda a casa de vermelho.

Hoje. Tinha de ser hoje. Ele não podia mais adiar. Aproveitaria enquanto elas dormiam. Olhou pro lado e viu Paula dormindo calmamente. Ele se levantou e foi ao escritório, ao lado de seu quarto. Abriu o armário, que guardava a sua coleção de armas, as quais usaria um dia para se proteger, caso fosse necessário. Pegou aquela pistola automática, que trouxera da Alemanha. Aproveitou e pegou também o silenciador. Foi à sua escrivaninha, abriu a gaveta... dentre vários de seus papéis, com números sempre em vermelho, havia uma seringa, também em vermelho. Fechou a gaveta.

Voltou ao quarto, e Paula ainda estava lá. Somente com um baby doll, justamente aquele que Alfredo lhe comprara na França. Aproximou-se dela e desferiu-lhe um tiro na testa. Ele viu repentinamente o próprio rosto no corpo de sua mulher; deu-lhe mais três tiros. Alfredo, então, foi ao quarto de Ana Paula, sua filha mais nova. Enquanto isso, lembrava-se da vez que fora seqüestrado. Foram quinze dias de torturas e humilhações.

Entrou no quarto da caçula, que vestia uma camisola do Mickey, e fechou a porta. Reparou nas fotos na parede. Entre algumas de suas fotos na Suíça e outras na África do Sul, havia astros americanos. Chegou perto dela e sentiu uma ansiedade de caçador. Quando ele mirou na cabeça dela, a garotinha abriu os olhos. Alfredo viu em seus olhos o medo. Ana Paula então lhe perguntou:

- O que está acontecendo, papai?

- Nada, minha filha. Logo você vai pra um lugar bem bonito, junto de sua mãe e sua irmã.

- Mas, e você papai?

Alfredo sentiu na boca seca o sabor de uma lágrima. Disparou cinco projéteis na filha. Saiu e foi ao último quarto. Dessa vez pensou em suas várias empresas, que foram fechadas uma a uma por tantas dívidas que fizera. Ele não conseguia entender por que se envolvera com aqueles agiotas. Agora aqueles canalhas lhe cobravam todo dia. Naquele dia mesmo recebera uma carta. Estavam inclusas fotos de sua esposa fazendo compras. Era por isso que não podia deixar que nada de mal acontecesse à sua família.

Chegou ao quarto de Cecília, sua “princesinha”. Esta ainda dormia, só de calcinha. Ela era sua filha preferida. Olhou antes na estante, onde viu livros de odontologia, além de várias obras em francês. Foi até bem perto dela e dali viu seu corpo perfeito. Ela sorria. Parecia um anjo. Pensou na sorte dos antigos namorados dela. Em como seria bom possuir aquele corpo. Não! Tirou a idéia que faz curvas da cabeça. Ele apontou a arma e disparou seis vezes. Já estava mais feliz. Voltou ao escritório e colocou a arma de novo no santuário.

Pegou a escopeta, que comprara no Pantanal, na última vez que visitara os pais. Foi até o banheiro do escritório. Estava chegando a hora. Ele não sabia por que estava mais leve? A sua época de criança voltou à memória, quando brincava com os amigos no rio Paraguai. O primeiro beijo, tão ardente, veio à sua cabeça, justamente com a garota mais cobiçada do colégio. Ele via flores. Colocou a boca da escopeta na testa. Ele estava eufórico. Chegara a hora. Não se preocupava mais com nada. A vida era boa. Deus me protege do Mal.

Na manhã seguinte, a empregada estranhou aquele perfume na casa, além de uma mancha vermelha na parede. Deviam ter matado um mosquito ali. E, como sempre fazia, foi arrumar primeiro o escritório do patrãozinho esquisito.

* texto escrito em 2004

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